08/08/2017

Nico Dall’agnol

Ele pendurou as chuteiras e viu no futebol a oportunidade da sua vida

Nico Dall’agnol
Ele pendurou as chuteiras e viu no futebol a oportunidade da sua vida
Após atuar 13 anos no futebol profissional, Idalcir Carlos Dall’agnol, o “Nico”, aceitou o desafio de treinar o juvenil do Lajeadense e, após, consolidou o seu nome na escolinha do Sete
Quando chutava uma bola de meia, no interior de Serafina Corrêa, Idacir Carlos Dall’agnol, 52 anos, o “Nico”, jamais imaginaria que anos depois marcaria Renato Portaluppi, jogaria um amistoso dentro do Beira-Rio contra a Seleção Brasileira e estaria à frente de um combinado entre times de Lajeado e Pedro Leopoldo em uma emocionante participação na Taça BH de Futebol Júnior.
Na bagagem, muitas histórias para contar, de uma época de vacas magras, de um tempo de bastante comprometimento, de uma ascensão após muito trabalho, de uma oportunidade de ouro e de uma valorização àquele que não só ensina dentro de campo, mas também é mestre quando o assunto é propagar os valores que todo atleta deve ter, desde a infância, tais como disciplina, respeito, coleguismo e humildade.
O sobrinho do tio Darci só foi ter a sua primeira bola quando completou 10 anos. “Minha família vivia na colônia. Jogávamos no potreiro, mas antes de dar início às partidas era necessário ir à caça dos atletas. Assim, a gente batia de casa em casa até formar um grupo”, recorda Nico. Aquele momento era mágico para os meninos. “A caminhada era grande até reunir todos, mas a recompensa estava na alegria de cada um de nós ao poder chutar uma bola de verdade.”
Aos 16 anos, Nico disputou o Campeonato Absoluta/Amador de Serafina Corrêa. No primeiro ano, já foi campeão com o time do tio Darci, o Guarani. “Desde o início, ele sempre foi o meu grande incentivador, pois meu pai não queria que eu saísse de Serafina.” Após boas participações nas partidas, Nico despertou o interesse do Gaúcho, que fez o convite para o volante jogar o Estadual Absoluta/Amador. “Ficamos campeões do Estadual, após ser o time que mais pontuou, dentro do Estádio Olímpico, em Porto Alegre.”
Taxado de jogador diferenciado, com um grande potencial, Nico agarrou a primeira oportunidade que teve durante o jogo de entrega das faixas aos campeões, em 1981. “O Esportivo de Bento Gonçalves tinha sido o vice-campeão gaúcho, que tinha o Valdir Espinosa no elenco - mais tarde, ele foi campeão mundial pelo Grêmio. Eles perguntaram a minha idade e me convidaram para fazer um teste.”
Já com 18 anos, Nico foi fazer o teste no Esportivo e passou. “Fiquei um ano morando na concentração em Bento Gonçalves e atuando nos juniores.” No fim de 1982, o jovem estava com saudades da família, pois nunca havia saído de Serafina Corrêa. “Tive algumas frustrações e voltei para casa.” Passado o período difícil, o jogador foi tentar a sorte no Gaúcho de Passo Fundo. “Eu e mais um fizemos o teste e nós dois passamos.” O colega de Nico desistiu, mas ele seguiu firme e forte. Assinou, pela primeira vez, a carteira de trabalho como atleta profissional de futebol.
Em 1984, o treinador João Carlos colocou Nico em campo e ele não decepcionou. “Entrei como titular e fui o melhor jogador do time na primeira fase, sendo o melhor em campo no clássico.” Time classificado para o octogonal final, e o técnico foi mandado embora, e Ramos da Luz, o “Machado”, foi a nova contratação do Gaúcho.
De volante a lateral direito
Com um treinador novo, Nico sabia que a boa campanha feita até então não seria suficiente para garantir a vaga no time. Não deu outra. “Ele me disse que se eu fosse um bom lateral direito ficava, senão, seria retirado da equipe titular.” Em choque, com uma certa mágoa, Nico calou-se e pensou que a resposta teria que ser dada em campo. “O jogo era contra o Estrela, que, na época, era invicto no Estado, em 38 jogos. Ganhamos por 1 a 0, um gol do Bebeto, e eu fui escolhido o melhor em campo.”
Para a alegria de Nico, a vaga de lateral direito estava garantida. “Sempre digo que é uma história que deu certo. O jogador precisa entender que a titularidade no time passa pelo treinador.” As boas notícias não pararam por aí. “Ficamos com o título da Segundona e subimos para a Primeira Divisão.” Nico tem ótimas recordações daquele ano. “Foi uma experiência única. É preciso ter estrela.”
No ano seguinte, em 1985, o Gaúcho de Passo Fundo disputou a Primeira Divisão do Campeonato Gaúcho. “Havia algumas sondagens para eu ir jogar na dupla Gre-Nal, mas nada se concretizou.” No final daquele ano, Nico recebeu a proposta para atuar no Clube Esportivo Lajeadense. “Em 1986, vim para Lajeado, pois a proposta era melhor do que a que eu tinha em Passo Fundo.”
Mais uma vez, a estrela de Nico brilhou. Ele foi o protagonista de um dos gols mais bonitos do Estádio do Florestal, em um clássico contra o Estrela. “Chutei com tanta vontade que a bola furou a rede e foi parar dentro das piscinas.” O time foi campeão da Segundona e garantiu o passaporte para a Primeira Divisão do Campeonato Gaúcho. “Foi um fato histórico. Saíram seis ônibus de Lajeado para a final em Erechim. O nosso jogo terminou primeiro e precisávamos que o São José perdesse. Deu gol deles, e quase morremos do coração, mas não foi, e para a nossa alegria, o Lajeadense subiu.”
Não bastassem todas as alegrias no mundo da bola, a vida pessoal também estava em festa, pois, em 1986, Nico conheceu a esposa, Helena Baségio, hoje com 54 anos, com quem teve, em 1996, a filha Vitória, atualmente com 19 anos. Em 1987, Nico continuou no Lajeadense.
Média de dois anos por clube
Em 1988, o treinador, que era do Gaúcho de Passo Fundo, levou Nico para o Pradense, de Antônio Prado. “Foi um ano memorável e de destaque, pois nunca tinha entrado em um octogonal final na Primeira Divisão.” Nos anos de 1989 e 90, o jogador vestiu a camisa do Brasil de Farroupilha. E, no ano seguinte, em 1991, retornou para o Alviazul. “Este foi um dos anos em que mais se viu um bom futebol na cidade.”
O ano da consagração de Nico foi em 1991, quando afirma ter se sentido satisfeito com o futebol que estava apresentando. Na época, atuou ao lado de Everton Giovanella, Vandeco, entre outros, e jogou contra atletas consagrados da dupla Gre-Nal, como Renato Portaluppi (Grêmio), Silvinho (Inter), Tita (Inter), Valdo (Grêmio) e Rubem Paz (Inter).
Naquele ano, o Lajeadense ficou com a 4ª colocação no Campeonato Gaúcho e, por ter a melhor disciplina, foi o time escolhido para jogar um amistoso com a Seleção Brasileira, no Beira-Rio, em Porto Alegre. “Perdemos por 4 a 0, mas o momento foi tão especial e único que nem nos importamos com o resultado.”
Em 1992, o ex-treinador do Lajeadense Gilberto Machado foi comandar o Concórdia, em Santa Catarina, e levou quase a metade do time de Lajeado para vestir a camisa da equipe, que estava na Primeira Divisão. “Fiquei um ano no campeonato catarinense, mas tive a infelicidade de ser atropelado.” No acidente, Nico quebrou a clavícula e a costela. “Fiquei cinco meses parado.”
De volta a Lajeado e recuperado, em 1993, o jogador foi para o Palmerense. “Na estreia contra o Ipiranga de Sarandi, rompi o ligamento cruzado interno. Foram 45 dias de muleta e gesso após passar por cirurgia.” Ele ficou um ano e meio parado. “Tentei me recuperar, fiz fisioterapia e, com 33 anos, tentei jogar no São Paulo de Rio Grande, mas no terceiro mês abriu um estiramento e parei.” Após uma carreira de 13 anos, Nico garante que pendurou as chuteiras por não ter mais forças e ter consciência de que já estava com uma idade avançada para o futebol profissional.
Da base do Lajeadense às escolinhas
Após ser convidado pelo diretor do time juvenil do Lajeadense, Elton de Andrade, Nico passou a atuar, em 1995, na categoria de base do seu time do coração. “Graças ao bom trabalho que desempenhei na base, o amigo Elio Giovanella (já falecido) me fez o convite para treinar o profissional em 1996 e 1997.”
No ano seguinte, em 1998, Nico teve a primeira experiência como professor de escolinha. O pontapé inicial ocorreu no Bairro Campestre, localidade em que reside com a família. Já em 1999, ele treinou o sub-21 do Concórdia de Roca Sales, em um campeonato que reuniu 56 equipes de todo o Estado, e o seu grupo ficou entre os quatro melhores.
Em 2000, Nico recebeu, do amigo Anécio Zerves, o convite para ser o professor da escolinha de futebol do Clube Esportivo Sete de Setembro. “Tinha a responsabilidade de trabalhar bem para agradar à sociedade e termos um bom retorno.” Ele não só agradou, como também fez bonito em muitas oportunidades. Quando assumiu o posto de professor, as categorias 88 e 90 faturaram dois títulos regionais. “Entre 2000 e 2011, o clube social revelou vários talentos. De 2000 até 2008, a escolinha do Sete estava entre as seis melhores do Estado.” Entre esses destaques, Rodrigo Ely (Milan), Rafinha Rizzy (Real Rieti), Moisés Wolschick (Grêmio), Alan Bald (São Paulo de Rio Grande), Gabriel Ribar Bloss (Grêmio), Leonardo (Figueirense) e Renan (Juventude).
Após 11 anos na escolinha do Sete, Nico balançou se deveria ou não aceitar a proposta do Lajeadense, mas optou por dizer “sim”. “Era mais um desafio pensando no futuro.” Entre 2011 e 2013, o treinador viveu momentos inesquecíveis. “Disputamos duas edições da Taça BH de Futebol Júnior, uma parceria do Lajeadense e Pedro Leopoldo.” Nas duas oportunidades, o Lajeadense brigou pela taça com os 20 melhores times do Brasil. “Sem sombra de dúvidas, foi uma experiência fantástica.”
As estrelas da Taça BH
O receio de fazer feio era inevitável, visto que ninguém acreditava que um time desconhecido pudesse desbancar grandes equipes, como, por exemplo, o Flamengo. “O 6º lugar foi quase como um título para nós.” Com a campanha considerada fantástica pelo grupo, todos se perguntavam, inclusive a imprensa, “quem é Pedro Leopoldo?”. “No avião, o Cícero Souza (na época diretor do Grêmio, hoje no Palmeiras) me chamou e disse que estava impressionado com o nosso time; questionou de onde tinha vindo tantos talentos.”
Nico se diz muito satisfeito por ter protagonizado e construído essa história com o preparador físico Pedro Francke e com os meninos de Pedro Leopoldo e Lajeado. “Tive a oportunidade de conhecer um dos ídolos da minha infância, o Dirceu Lopes.” O professor de escolinha diz que teve uma boa visão do que é o futebol. “Foi muito gratificante ter tido a oportunidade de estar naquele ambiente.”
Pela boa campanha em 2011, o time voltou a participar em 2012. “Na Taça BH de 2012, fomos o time menos vazado na primeira fase, sofrendo apenas dois gols em cinco jogos.” No Mineiro (Estadual de juniores de Minas Gerais), o grupo caiu na semifinal. “Terminou o ciclo, e eu voltei para o Lajeadense.”
Em 2013, Nico comandou os juniores no Gauchão e, no segundo semestre, voltou para a escolinha do Sete, onde atua até hoje. “Optei por retornar em razão da insegurança do futebol profissional e calendário indefinido.” O professor se diz muito feliz com a decisão de voltar a estar perto das crianças e adolescentes, com idades entre 6 e 15 anos. “Sempre temos uma média de 200 alunos.”
Realização pessoal
Nem pensar falar sobre aposentadoria com Nico. Ele garante que enquanto tiver saúde, estará envolvido diretamente com o futebol. “Quero sempre dar o melhor de mim.” Professor de pais, agora, ele ensina os filhos. “Sempre encontro nos lugares alguma criança ou adulto que passou pelas minhas mãos, seja no Lajeadense ou no Sete, e isso é muito gratificante.”
O professor garante que jamais imaginou que uma pessoa do interior tivesse tanta sorte e, ao mesmo tempo, estrela para passar por tantos momentos especiais no mundo da bola. “Meu sentimento é de satisfação em vencer e progredir. Onde coloquei a mão, graças a Deus deu certo.”
Na bagagem, muitas histórias para conta, e para o futuro, Nico só tem, até então, um plano definido. “Quero dar condições para que a minha filha possa ter uma profissão e ser bem-sucedida.” Sobre o lado profissional, o mestre diz viver um dia após o outro. “Só não posso e nem quero ficar parado.”
Ele garante que o foco, agora, é a escolinha e o desejo de sempre estar em constante crescimento. “Não me vejo em outro lugar, fazendo outra coisa que não seja ligado ao futebol.” Nico explica que a sua doação ao trabalho é quase diária. “Somente na segunda não temos treinos, e nos fins de semana ocorrem os jogos.”
Como referência no futebol, o ex-jogador cita as habilidades de Maradona, Pelé e Messi. “São atletas que produzem uma coisa boa aos nossos olhos.” Já quando o assunto é treinador, Nico destaca o trabalho de Ramos da Luz. “Não foi um técnico de expressão, mas foi quem me alavancou na vida e sou muito grato por isso.”
Texto: Carolina Gasparotto

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