10/08/2017

Renata Schaefer

A bandeirinha média 8,5

A bandeirinha média 8,5
Em decorrência dos erros que comete em campo, Renata Schaefer, 37 anos, não se considera perfeita e diz que em uma escala de 0 a 10, 8,5 é a nota ideal
A cada dia que passa, a mulher conquista mais espaço nas profissões que antes eram vistas como voltadas ao público masculino. É preciso muito jogo de cintura para lidar com as constantes piadas, grosserias e até mesmo atitudes machistas que, em pleno século XXI, ressurgem uma vez ou outra. Como o futebol ainda é bastante associado aos homens, quando o sexo feminino dá pitacos sobre a partida e, mais do que isso, é voz ativa em um jogo, é sinal de que o mundo está evoluindo.
Com meias de futebol, uniforme, cabelo amarrado e uma leve maquiagem, Renata Schaefer, 37 anos, busca o seu espaço e mostra que, em poucos anos, foi possível ter o reconhecimento pelo seu trabalho, que começou em sala de aula e, agora, é vivenciado, na prática, todas as vezes que é convocada para bandeirar. Ao lado de grandes nomes da arbitragem do Brasil, como Leandro Vuaden, Altemir Hausmann e Leonardo Gaciba, ela construiu o seu nome em cima de muitas decisões acertadas.
Natural de Lajeado, Renata sempre residiu em Colinas, onde cursou o Ensino Fundamental e o Médio. Depois de concluir o seu estágio, em 1998, ingressou no curso de Educação Física da Universidade de Santa Cruz do Sul, a Unisc. Após ser vítima, com um amigo, de um sequestro-relâmpago, a estudante precisou buscar forças para superar o ocorrido e, somente dois anos depois, retomou os estudos. “É um assunto que não faço questão de falar muito, mas já conto com mais tranquilidade”, sintetiza.
Passado o susto, os momentos de isolamento e tristeza, Renata optou por concluir os estudos na Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), em Canoas. “Participei do Projeto 500 Anos. Fazia três cadeiras por semestre e consegui me formar em 2007.” Coincidência ou não, no mesmo ano havia um curso da Federação Gaúcha, e, ela, conhecia federados que já trabalhavam, tais como Leandro Vuaden, Fabrício Corrêa, Márcio Chagas e Márcio Coruja - todos eles a indicaram para o curso. “Não pensei duas vezes e utilizei o dinheiro da festa de formatura para garantir a minha inscrição.”
Federação Gaúcha
Assim, todas as sextas e sábados, entre os meses de agosto e dezembro de 2007, Renata deu o seu melhor para aprender tudo o que podia durante o curso da Federação Gaúcha. “Era uma mistura de teoria e prática. No Parcão, nós trabalhávamos com as escolinhas e times, como o São José de Porto Alegre, por exemplo.” No último mês daquele ano, chegou a hora de participar dos testes físico e teórico para então realizar o sonho da formatura. “O sistema nervoso era o meu único ponto fraco, mas consegui me sair muito bem na prova. Fui a única mulher que passou.”
Com a permissão para atuar como bandeirinha, já em janeiro de 2008, Renata trabalhou no Efipan, no município de Alegrete. Desde então, passou a ser observada pela federação, visto que havia sido indicada por Vuaden e por demais árbitros renomados. “Meu primeiro jogo foi um Gre-Nal de um campeonato sub-11”, recorda. Já a partida da final, ela trabalhou ao lado de Gaciba. “Gente finíssima.”
Como todo o início, o trabalho de Renata precisava passar por alguns ajustes, e foi o presidente da comissão, Luís Fernando, o “Cruze”, que corrigiu suas falhas como bandeirinha. “Fiz um trabalho forte em cima do meu problema de ficar posicionada na diagonal.” Após as correções, na metade de 2008, a profissional foi chamada pela federação para começar a atuar na região de Porto Alegre, pois até então ela só trabalhava por Caxias do Sul. “No final de 2008, recebi o escudo feminino da CBF, momento em que subi de categoria ao lado da amiga Tatiana Freitas.”
Boa fase
A partir de 2008, Renata começou a trabalhar bastante como bandeirinha. “Subi para a A e comecei a fazer Gauchão.” Para tanto, passou pelo teste físico em janeiro e julho e, na metade do ano, também pelo teórico. No ano seguinte, em 2009, para trabalhar no Campeonato Brasileiro, ela treinou com muito afinco sob o olhar atento de Florindo Ghidini, no Estádio do Lajeadense. “A prova eram seis tiros de 40 metros em 6,2 segundos, e eu queimei, pois fiz em 6,3 e 6,29 segundos.”
Mas, durante o Campeonato Gaúcho, Renata atuou ao lado daqueles que acreditaram no seu potencial desde o início e também com os que ela admirava como profissional. “Gostei de trabalhar com todos eles; o Altemir, o Vuaden, o Gaciba, todos são excelentes árbitros.”
A bandeirinha conta que desde uma partida entre Grêmio e Juventude, realizada na Páscoa, Gaciba, amigo também fora dos campos, a chama de coelha. “Era um dia muito frio, com lances bem complicados. Me saí bem e fiquei conhecida, por ele, como a coelha da sorte.”
Fora de campo, a harmonia impera entre os profissionais, e Renata afirma que se relaciona bem com os colegas. “Criamos uma amizade bonita entre todos do nosso meio.” E isso muito se deve aos períodos de pré-temporada, momento em que se formam grupos de trabalho, e os profissionais conseguem trocar ideias. “O Altemir é um que sempre conversava comigo no fim dos jogos. São coisas que sempre somam à carreira.”
Renata conta que também atuou com o ex-árbitro Carlos Eugênio Simon. “O Simon queria trabalhar com todo mundo da federação, e eu consegui fazer um jogo com ele.”
Desde 2006 nos Regionais
Antes de ver a sua carreira como bandeirinha decolar, Renata começou o seu trabalho em partidas locais, nos campeonatos municipais e regionais. “Aqui é a base de tudo. Se estiver livre é aqui que venho. É aqui que a gente aprende.” A profissional garante que jamais irá abandonar o Regional, pois foi no Vale do Taquari que recebeu o incentivo para seguir em frente. “Aqui também estou mais próximo do meu filho.”
Renata recorda que o início no interior foi bem difícil, mas conforme foi aparecendo na televisão, conquistou o respeito do público. “Eles falavam: ‘Aquela guria faz Gauchão’.” O fato de ser mulher atrai a atenção para os erros, segundo a bandeirinha. “Por isso, procuro sempre dar o meu melhor e mais um pouco, seja Gauchão ou Regional.”
Entretanto, ela diz que é comum ouvir frases do tipo: “Vai lavar roupa”, “vai para o fogão”. O mais curioso é que as palavras não são pronunciadas apenas pelos homens, mas, também, pelas mulheres. “Tudo o que for feito dentro de campo que não for a favor do time da pessoa, nós, enquanto arbitragem, estamos sujeitos a qualquer tipo de insulto.”
A bandeirinha diz que gostaria de sempre acertar, mas que seres humanos erram e acertam todos os dias. Mesmo bastante dedicada ao trabalho, sempre atenta à linha e com cuidado redobrado para não piscar em nenhum lance, Renata diz que não é perfeita e, em uma escala de 0 a 10, se dá 8,5. “Sinto que, às vezes, precisava ser mais incisiva nas minhas decisões, confiar mais na minha opinião e no que eu acho que é.”
Já em outros casos, a situação, às vezes, foge da sua função como bandeirinha. “A autoridade máxima é o árbitro.” Renata diz que sempre procura sair dos jogos com a cabeça tranquila, mas quando ocorrem erros é impossível não se abalar e existir cobranças por ela mesma. “Agora que sou mãe, estou mais sensível, mas a leitura e o carinho dos amigos ajudam bastante nessas ocasiões.”
Família e futuro
Se o assunto é futebol, Renata chama o pai, Erno Schaefer, para conversar, pois o marido, Darlan Messer, não é fã de falar sobre o assunto. “Ele não gosta. Temos cavalos, e ele prefere o mundo dos rodeios (risos).” Filha única de Odete Schaefer - os dois irmãos já faleceram -, Renata diz que bandeirou na final do Regional de 2007 em homenagem ao irmão, vitima de infarto fulminante. “Sou muito família e sempre recebi o apoio deles. Achei que seria justo trabalhar naquele momento e dedicar ao meu irmão.”
Ao lado do marido e do filho, Ryan Messer, de 4 anos, Renata diz viver o dia de hoje. Além do trabalho como bandeirinha, ela atua como professora na Escola Guilherme Sommer, no Bairro Canabarro, em Teutônia, e faz pós-graduação em Educação Física escolar a distância. “Ainda não tenho planos para o próximo ano.”
A profissional ganhou um gancho da federação após um lance envolvendo o terceiro cartão amarelo em uma partida classificatória do Gauchão. “A CBF cobra bastante o porcentual de gordura, e eu tenho dificuldades nesse sentido por causa da gravidez.” Renata diz que abriu mão de muitas coisas para ser mãe. “Era um desejo que eu tinha ser mãe até os meus 35 anos.”
Por isso, Renata renunciou a trabalhar na final da Copa do Brasil feminina, momento em que seria indicada aspirante Fifa. “Foi um momento bem complicado, mas a vida é feita de escolhas, e estou muito feliz e realizada com a que fiz, pois, agora, descobri o que é amor de verdade.”
Enquanto não decide sobre o seu futuro profissional, Renata diz seguir com suas atividades físicas, como corridas e sessões de pilates, além de sempre ficar de olho na alimentação. “Meu pecado é o doce (risos).”
Texto: Carolina Gasparotto

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